Seu Gonçalves, peço um favor:
Emprestar-me tua obra prima.
A CANÇÃO DO EXÍLIO me inspirou
Pra eu tentar cá umas rimas.
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Tu falavas em palmeiras,
Campos, flores, sabiás,
Belas coisas brasileiras,
Faziam a gente se emocionar.
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Voltar pra cá era tua vontade,
Só que a volta não tem mais volta.
De fora, tu sentias saudade.
De dentro, eu sinto é revolta.
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De olhar como o descaso
Desfez este belo país.
O que parecia ser atraso
Fazia o povo mais feliz.
~
Nossa terra tinha palmeiras
Onde cantava o sabiá.
A palmeira virou fogueira,
O sabiá virou jantar.
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Nosso céu tinha estrelas,
Tantas, nem dava pra contar.
Hoje mal consigo vê-las
Tanta fumaça tem no ar.
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Água pura a esbanjar,
Tantos rios, córregos limpos.
Só que não vai muito durar,
Com o mercúrio dos garimpos
~
As palmeiras tinham ninhos,
Hoje têm ninho de cupim.
Se estão faltando passarinhos,
Tem barata com asas a não ter fim.
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Tem pet shop de montão
Pra nossa fauna abrigar.
Tem frango, porco, gato, cão.
Só não ouço gorjeio de sabiá.
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Tantos bichos (mas que dó!)
Já se foram, não voltam mais.
Nossos filhos, em breve, só
Em fotos vão ver animais.
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Bichos, plantas em extinção,
A cada dia aumenta a lista.
Quem cuida da preservação
É a bancada ruralista.
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Se o nosso agro é mais pop,
O lavrador ficou sem nada.
Orgânico aqui não dá ibope.
Tome-lhe comida processada!
~
As verduras todas coloridas,
Cada legume colossal.
O segredo: os herbicidas
E agrotóxico a dar com pau.
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Nossa fruta tem mais venenos
Pra deixar de vir bichada.
Só que o sabor ficou de menos
E um asséptico gosto de nada.
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Todas vêm com a mesma roupa:
Goiaba, manga, abacaxi.
Enquadraram tudo em polpa
Ou como suco Maguary.
~
Dizem que a gente é o que come.
Aí vieram os transgênicos.
Não acabarão com a fome,
Mas deixarão todos anêmicos.
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O de cima faz a conta:
‘A economia tá evoluindo’.
Só que essa conta não leva em conta
Que a qualidade vem decaindo.
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Dizem que o país cresceu,
Subiu a renda e o produto.
Se aumentou não foi o meu
Pois dessa grana não vi um puto.
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O produto interno bruto
As pessoas embrutece.
Quanto mais cresce o tal produto,
Mais vejo gente que padece.
~
Culpa do neoliberalismo,
Tudo centrado no mercado.
Uns poucos ficam com o filão.
O grosso, marginalizado.
~
Criou-se um oásis de riqueza
Numa nação que se esfrangalha.
Alguns se banqueteiam à mesa,
O resto vive de migalha.
~
Acabaram com o fiado
E a vendinha do Juvenal.
Foi todo mundo massacrado
Pelo poder do capital.
~
Nosso progresso é macabro,
Na cidade deixa mazelas.
Pra cada shopping que eu abro,
Aparecem dez favelas.
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O governo não tem planos,
Executa tudo às pressas.
O horizonte é quatro anos.
Depois disso, não interessa.
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Corta a verba da educação.
Mas não mexe nos gastos bélicos.
Nem na grana do Centrão
Ou pra adular os evangélicos.
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Acabaram com a cultura,
Arruinaram as artes e a ciência.
Nem durante a ditadura
Houve tamanha decadência.
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Grana não falta pro patrão,
Tem crédito a CNPJ.
Ao pobre, só na época da eleição.
A árvore? Corta! Ela não vota.
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O presidente belicista
Quer mais polícia e armamento.
Meio-ambiente? “Tira da lista!
Só atrapalha o crescimento”.
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O bronco ignora a natureza.
Não percebe o potencial.
Pensa poder gerar riqueza
Dilapidando o capital
~
Parece até o ‘esperto’ da lenda.
Ovos de ouro ele juntava.
Pra crescer logo sua fazenda,
Matou a galinha que os botava.
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Um modelo que leve em conta
A imensa riqueza natural
Faria deste um país de ponta
Na nova ordem mundial.
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Natureza exuberante,
Tanto turismo a explorar.
Mas nosso tosco governante
Quer só commodities pra exportar.
~
Feito o estrago, o responsável
No futuro não vai estar lá.
Pelo país inabitável,
Quem nossos filhos vão cobrar?
~
Se o poeta estivesse vivo,
No exílio seria mais feliz.
Não teria mais motivo
Pra tecer loas a seu país.
~
Bons dias os de Gonçalves Dias.
Os de hoje em dia já não são.
Se o inverno e o outono têm mais dias,
Primaveras não se verão.
~
E o infeliz do sabiá
Era feliz e não sabia.
Ressabiado, foi gorjear
Numa outra freguesia.
~
Palmeiras, flores, sabiás,
Coisa boa não se herda.
Meia volta, marchar pra trás!
Que o progresso deu em merda.
(Adaptado do meu livro O QUE DE MIM
SOU EU)
2 comentários:
Salve, muito bom, peço que a envie ao genocida, incendiário e exterminador do futuro: o presidente capetão!
Muito Bom! É triste, mas verdade!
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