Esparrama-se o vagabundo liquidamente das irredutíveis fronteiras lineares delineadas pelos carris da inabalável e fria via férrea ferruginosa que insidiosamente enverga pelo interior da caverna da noite desluada. Cambaleia, ziguezagueando as linhas teimosamente paralelas que se fincam qual degraus de uma escada infinita, relutantemente escorada em adormecidos dormentes de madeira morta.
O estropiado estafermo
faz de conta que contas faz dos muitos trilhos, trilhões, a serem pisados,
trilhados, noite adentro, madrugada afora. Até que possa concluir sua jornada
transnoitana e, entregue, entregar ao destino seu desatino, sua desgraça e sua
carcaça, carga esquálida retalhada, remendada, fétida, com seus carbonizados trapos
de chumaços, esparadrapos, plásticos, fezes, graxa, gangrenas e vermes.
Pensamentos
estupendamente estúpidos irrompem da demente mente encharcada desse maltrapilho
espalhafatoso, palhaço espalhado, empalhado, gosmento, azedo, asqueroso, podre,
pútrido.
Aos percalços, pés
descalços, vaga vagabundo aos trancos pelos flancos e barrancos, bebadamente
descaminhando. Apega-se desesperado à cadência sensata dos trilhos que emergem,
sóbrios, soberbos, da escuridão suburbana e molhada, à espera do banido trem da
remição. Dão-lhe o suporte cadenciado para, na perdição, não se perder, para
não acabar de se acabar.
Esborracha-se o
borracho pesado, despedaçado, caindo-se na verticalidade de seu próprio aprumo.
Esvai-se e esvazia-se de si. De algum ponto de vista, avista tortas, tontas e
tantas linhas desalinhadas, a formar disformes formas deformadas.
Do trotar sereno,
sonoro e sonado de minhas imprecisas teclas, fugazes palavras ocorrem oblíquas,
reversas, impostoras, bocejadas. Conduzem elas lisergicamente o apalpar dos
meus dedos titubeantes e dos meus toques flutuantes no ritmo dos passos
esparsos, dos trôpegos tropeços, desse arremedo medonho de homem, embriagado
pelo aguardente desejo de dobrar a irretorquível sequência das estacas tecladas
do cambaleante comboio. Lerdas letras alongam-se, engalfinham-se, recusando-se
a compor vocábulos e sentidos. Meus olhos desoculados, indolentes entreveem
turvas curvas e imprecisas imagens difusas e confusas, inspirando-me a
desconstruir, pelo avesso, ideias dispersas e a formar vagas frases vagabundas.
Tiro-me.
Texto extraído do meu livro O QUE DE MIM SOU EU
Um comentário:
Vc é um grande poeta, mas suspeito que o destinatário destas linhas desalinhadas desistiria de ler na segunda linha, por não entender o que vc esttdizendo.
Postar um comentário