quarta-feira, 11 de agosto de 2021

CLOROQUINA ELEITORAL

 

Caso um turista estrangeiro, não informado das excentricidades desse singular país tropical, por aqui aportasse, certamente ficaria perplexo com a movimentação incomum ocorrida nos últimos dias que parecia colocar o país em pé de guerra.

Durante esse período conturbado, o país viveu uma crise sem precedentes entre os três poderes: o presidente da república ofendeu com palavras de baixo calão integrantes do STF; militares ameaçaram com quarteladas o parlamento; apoiadores do governo mobilizaram-se em ruidosas concentrações; blindados desfilaram pelas ruas de Brasília.

O desavisado forasteiro certamente perguntaria, intrigado, qual a razão de tal efervescência. Ao ser-lhe esclarecido que essa balbúrdia toda foi motivada pela “urna eletrônica”, ele questionaria, incrédulo, qual o grave problema detectado nesse sistema de votação para gerar tamanha celeuma: fraude nas apurações? manipulação de resultados? interferências de hackers?

Nada disso. As eleições no Brasil têm transcorrido num clima de excepcional tranquilidade e com uma respeitabilidade invejável. Poucas horas após o escrutínio, o resultado é tornado público sem nenhuma contestação relevante, jamais tendo sido constatada qualquer irregularidade. Uma Justiça Eleitoral isenta tem garantido exemplarmente a transparência e a credibilidade do processo, tanto que os resultados têm sido acatados por todas as partes sem impugnações.

Se tudo vem transcorrendo num ritmo de absoluta normalidade, qual então razão de toda essa algazarra?

Para responder essa pergunta, será preciso ressuscitar um medicamento que esteve em evidência até há pouco tempo: a CLOROQUINA.

“Ué!”, indagaria o cada vez mais confuso, gringo “Que diabos tem a ver um remédio de ineficácia comprovada com as urnas eletrônicas de eficácia comprovada? ”

Explico.

Em 2020, a pandemia disparou e o Brasil assumiu a malfadada liderança no número de óbitos. O assunto pegou o governo de calças curtas. O presidente, pouco afeito a lidar com questões de tal complexidade, tratou de varrer o problema para debaixo do tapete, fazendo pouco caso da ‘gripezinha’ e desacreditando as máscaras e o isolamento, ao contrário do que fizeram governantes sérios das demais nações. Abriu mão de coordenar ações de enfrentamento à doença letal e foi dedicar-se ao que realmente gosta de fazer: passear de jet ski.

Mas seria injusto acusar Bolsonaro de omisso. Ele guardava na manga uma receita infalível para combater a pandemia, uma droga milagrosa, capaz de debelar do país o coronavírus: a CLOROQUINA.

Enquanto todas as nações mobilizavam-se em conseguir vacinas, o Brasil revelava as maravilhas da cloroquina que o resto do mundo era incapaz de vislumbrar. E assim, os apoiadores do governo, ignorando os cadáveres que se acumulavam sob seu nariz, exaltavam os milagres propiciados pelo infalível medicamento que a medicina teimava em desconsiderar.

Dois gabaritados ministros da saúde que se recusaram a aceitar a esparrela para não cair em descrédito perante a comunidade científica, foram sumariamente defenestrados e substituídos por um militar servil que nunca abriu uma bula de remédio na vida, colocando o chamado “tratamento precoce” na ordem do dia.

Todos foram engolfados pelo assunto e de repente qualquer pé-rapado ganhou status de mestre em infectologia, em condições de colocar no chinelo os diretores do Einstein e do Sírio Libanês. Nas cervejadas e reuniões familiares, o futebol e as novelas perderam espaço. O quente agora era exaltar as virtudes do santo remédio receitado pelo Mito, panaceia para todos os males, exceto a burrice.

Nosso presidente-cloroquina dispensou de vez os ritos da liturgia do cargo para assumir em suas lives o papel de garoto propaganda da abençoada droga. Tentou convencer até uma ema a usá-la. Cômico se não fosse trágico.

As outrora respeitáveis Forças Armadas foram convocadas a protagonizar a comédia dramática. Enquanto vacinas que poderiam ter impedido centenas de milhares de mortes foram recusadas, o exército investiu uma fortuna na fabricação de milhões de comprimidos de cloroquina, formando estoque suficiente para atender duas gerações futuras de usuários.

Após quase um ano de alucinação coletiva, as milícias digitais do governo perceberam que o assunto não rendia mais ibope, em vista da adesão em massa à vacinação e resolveram enfim sepultar a cloroquina.

Porém era preciso invocar outro tema para ‘manter as bases mobilizadas’. É aí que entra em cena o “VOTO IMPRESSO”.

O dilema “urna eletrônica x voto impresso” era até anteontem assunto alheio para 99% da população, preocupada com questões mais prementes (e indigestas) como a volta da inflação e a crise social crescente.

Os estrategistas do Planalto então montaram um plano orquestrado para bombar a matéria. Robôs articularam mensagens em massa para as mídias sociais para levar o “voto impresso” ao topo dos assuntos mais comentados da internet, desviando o foco de temas indesejáveis como as investigações da CPI e os acordos com o Centrão.

Pessoas humildes, antes preocupadas com questões ‘prosaicas’ como a falta de comida na geladeira e a elevação no preço do gás, passaram, de uma hora para a outra, a ser ferrenhas defensoras do voto “auditável” (eufemismo utilizado para dar ao cacareco uma aparência glamourosa).

Para contrapor-se à catarse coletiva, a parcela mais lúcida e esclarecida da população viu-se na obrigação de gastar pacientemente o verbo tentando ingenuamente convencer o ‘gado’ que dois mais dois são quatro. Em vão.

Estamos vivendo tempos bíblicos em que os oprimidos não apenas acatam espontaneamente as narrativas do opressor como supõem serem bandeiras contra a opressão. Maquiavel e Orwell se sentiriam humilhados.

E enquanto as pessoas digladiam-se em discussões acaloradas e promovem enquetes no facebook para aferir a necessidade de se implantar o tal do voto impresso, o presidente aderiu a um novo hobby: passear de moto.

A maneira mais eficiente de poupar o (e)leitor de assistir sua sanidade se esvaindo com essa questão bizantina é  compreender que esse falso dilema de fato não existe. É fruto de uma hipnose coletiva. Tal qual a cloroquina, é uma falácia dos artífices do presidente para impedir a sociedade de respirar alguns momentos de tranquilidade e manter um clima permanente de beligerância, modus operandi dos atuais donos do poder.

Libertemo-nos, pois, dessa ilusão, deixemos as urnas em paz e nos debrucemos para as grandes questões nacionais que realmente importam.

Ao que tudo indica, o ‘voto impresso’ será em breve enterrado pelo congresso e tudo voltará à normalidade. Mas não por muito tempo... Não se anime, caro (e)leitor, pois assim que o assunto for encerrado o presidente bufão e sua trupe de lunáticos tirarão da cartola uma “nova cloroquina” para perturbar nosso sossego.




 

Um comentário:

Anônimo disse...

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